O caos organizado de Wes Anderson

O caos organizado de Wes Anderson

Dentro de suas particularidades que o tornam importante no “cinema de autor”, Wes Anderson usa da metalinguagem para opor o rigor estético ao caos narrativo em “Asteroid City”.

  Wes Anderson é possivelmente o diretor mais reconhecível do cinema atual. Se ele fizer um filme sem que ninguém avise quem é o diretor, é provável que a maioria das pessoas que conhecem seu trabalho entendam facilmente que é uma obra dele. O “rigor” estético, tão particular, é uma característica tão marcante e chamativa que é, muitas vezes, o ponto principal dos seus filmes e deixam a própria narrativa em segundo plano. “Asteroid City” é mais um desses.

  A montagem dos filmes de Wes, entretanto, são bastante coerentes com as suas narrativas. Sempre dão, através da cores mais vivas, da disposição centralizada, simétrica e rigorosa dos elementos, além dos cenários e da edição em si, sempre dão um tom especialmente teatral, lúdico, cômico e até frontal às narrativas que são apresentadas.

  Em “Asteroid City”, filme recém-lançado pelo realizador, Wes Anderson mantém todas essas características para contar uma história que está sendo contada em uma peça de teatro. Ou melhor, uma história sobre uma pessoa que escreveu uma peça e o processo da peça sendo contada num programa de televisão. Parece confuso porque é mesmo, mas não só é proposital como é muito inteligente.

  Durante o filme, enquanto apreciava todo o mundo particular que Anderson consegue criar a partir de sua própria identidade visual, a despreocupação com o que era falado dentro da peça intitulada de Asteroid City tomou conta e deu lugar ao questionamento relativo a sobre o que era o filme. Se era sobre a peça, sobre o diretor da peça ou se era sobre aquela história do pai(Jason Schwartzman) que recém perdeu a mãe dos filhos, da atriz melancólica(Scarlett Johansson) e tudo que se passava naquela cidade que, inclusive, recebe um alienígena do nada.

  Tudo na cidade era e acontecia do jeito mais caricato possível e que, sinceramente, achei muito legal. É das histórias que me causam a sensação de não chegar a lugar algum, mas que não precisam. E “Asteroid City” não só não precisa “chegar a algum lugar”, mas, no fim, acho que o filme era sobre isso mesmo. A cena, na reta final do filme, em que tudo se mistura, se desconecta e o ator que interpreta Augie Steenbeck abandona a peça com o receio de não saber sobre o que se trata o seu trabalho ganhou um espaço enorme de reflexão na minha cabeça.

  Além da reflexão sobre o que é o “sentido” numa produção cultural, Anderson ainda coloca ali e na reunião entre os atores, onde Willem Dafoe, por exemplo, interpreta um especialista em atuação, uma denúncia para si próprio sobre o engano. Arte, sobretudo a atuação, é mentira. Puramente engano. Asteroid City, seja o filme, a peça ou a cidade, não passa de um instrumento para Wes pôr em tela o engano, a ilusão.

  Ao colocar o ator da peça para questionar o que ele mesmo fazia ali, além de assumir a intenção de fazer a trama do filme desinteressante, Asteroid City reconhece sua posição como produto artístico, como engano: a peça é uma mentira, os atores são de mentira e seus personagens dentro da peça, que estão dentro da televisão, que está dentro do filme, não passa daquilo que é: arte. 

  Mesmo que eu concorde um pouco com as críticas que avaliam o filme como estéril, artificial, pitoresco, caricato e coisas do tipo, “Asteroid City” é uma obra que mostra que Anderson tem o que poucos tem: auto-reconhecimento. Se compreende muito bem e dá uma amostra perfeita de um “cinema consciente” que se manifesta na sua paródia de si próprio e nos personagens que escolhe sabiamente para que isso se mantenha. Sabe o que faz e faz muito bem. Entende os “o que” sem precisar de “porques”. 

 

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Caio Azevedo

19 anos, estudante de Jornalismo pela UFRRJ.

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